7 de março de 2013


Nem tudo é fácil

É difícil fazer alguém feliz, assim como é fácil fazer triste.
É difícil dizer eu te amo, assim como é fácil não dizer nada.
É difícil valorizar um amor, assim como é fácil perdê-lo para sempre.
É difícil agradecer pelo dia de hoje, assim como é fácil viver mais um dia.
É difícil enxergar o que a vida traz de bom, assim como é fácil fechar os olhos e atravessar a rua.
É difícil se convencer de que se é feliz, assim como é fácil achar que sempre falta algo.
É difícil fazer alguém sorrir, assim como é fácil fazer chorar.
É difícil colocar-se no lugar de alguém, assim como é fácil olhar para o próprio umbigo.

Cecília Meireles

Mesmo antes de nascer, já tinha alguém torcendo por você.
Tinha gente que torcia para você ser menino.
Outros torciam para você ser menina.
Torciam para você puxar a beleza da mãe, o bom humor do pai.
Estavam torcendo para você nascer perfeito.
Daí continuaram torcendo.
Torceram pelo seu primeiro sorriso, pela primeira palavra, pelo primeiro passo.
O seu primeiro dia de escola foi a maior torcida.
E o primeiro gol, então?
E de tanto torcerem por você, você aprendeu a torcer.
Começou a torcer para ganhar muitos presentes e flagrar Papai Noel.
Torcia o nariz para o quiabo e a escarola.
Mas torcia por hambúrguer e refrigerante.
Começou a torcer até para um time.
Provavelmente, nesse dia, você descobriu que tem gente
que torce diferente de você. (...)

Carlos Drummond de Andrade
Para sempre

Por que Deus permite
que as mães vão-se embora?
Mãe não tem limite, é tempo sem hora,
luz que não apaga quando sopra o vento
e chuva desaba, veludo escondido
na pele enrugada, água pura, ar puro, puro pensamento.
Morrer acontece com o que é breve e passa sem deixar vestígio.
Mãe, na sua graça, é eternidade.
Por que Deus se lembra - mistério profundo - de tirá-la um dia?
Fosse eu Rei do Mundo, baixava uma lei:
Mãe não morre nunca, mãe ficará sempre
junto de seu filho e ele, velho embora,
será pequenino feito grão de milho.

Carlos Drummond de Andrade
A morte

Rio de Janeiro
A morte vem de longe
Do fundo dos céus
Vem para os meus olhos
Virá para os teus
Desce das estrelas
Das brancas estrelas
As loucas estrelas
Trânsfugas de Deus
Chega impressentida
Nunca inesperada
Ela que é na vida
A grande esperada!
A desesperada
Do amor fratricida
Dos homens, ai! dos homens
Que matam a morte
Por medo da vida

Vinícius de Morais

O violinista

No calor de 40 graus,o músico bonito
Toca seu violino mágico balançando
Seus cabelos de Jesus Cristo.
No meio da rua seu som compete
Com o ruído dos carros, o grito
dos camêlos,
Que ousam tirá-lo de seu lindo torpor.
Sua música me acompanhou muito além
Da suja avenida.
Aquelas notas doces irão sempre tocar
Em minha vida.

Bárbara Reis

Deslocada

Não há como me identificar com essa gente tão contente, tão despreocupada, tão iludida, quando entro nesta sala me sinto medida. Por mais que tente dar um tom esperançoso para cada atitude minha, a razão fala mais alto então, minha esperança definha. A verdade é que não há agonia, o que era de se esperar tornou a minha vida e o previsível é tão morno e tão sem graça que tira toda a expectativa que eu teria em abrir os olhos, respirar o ar fresco e perceber que ainda tenho algo a fazer neste mundo palpável ... A verdade imutável é que talvez falte vontade e sobre comodismo e eu me limite a reclamar sobre as coisas ao meu redor porque tenho me sentido só.

“And anytime you feel the pain , Hey Jude , refrain

Don’t carry the world upon your shoulders

For well you know that’s a fool

Who plays it cool” - Hey Jude - The Beatles

Bárbara Reis
O terminal

Finalmente chegou ao terminal rodoviário. Os semblantes cansados em fila facilmente poderiam
representar os muitos outros que passam por ali todos os dias. Os vendedores, esses sim, são os ilustres
desconhecidos de todos os dias. No entanto, as vozes que normalmente anunciam todo tipo de bebida no calor infernal do Rio de janeiro, agora,soam fracas. Como rádio cuja pilha aos poucos se esvai. O chão, castigado e encardido, está molhado dos pingos de chuva que infiltram o teto e da água que pinga dos muitos guarda chuvas que são sacudidos. Sobre ele ainda há lixo, papéis e inúmeros tocos de cigarro. Mas não,isso não ilustra a miséria de um ambiente,mas os diferentes níveis da decadência humana. A impaciência torna-se palpável no ar - ou quase. Há muito já foi aprendido que percepções pessoais dos membros da
minoria dificilmente são um retrato válido do que se passa com os outros. A demora é rotina,assim como entreouvir as muitas conversas frívolas. Não leve esses escritos tão a sério. Afinal,ela só tinha 17 anos.

Bárbara Reis